A
raiva é uma emoção. Violet Oaklander, psicoterapeuta de crianças e adolescentes
reconhecida pelo seu trabalho, pontuou que a raiva é uma das emoções mais
incompreendidas. Concordo com ela e penso que todas as emoções são, de
certo modo, incompreendidas. Isso porque vivemos em um mundo que parece
ignorá-las, desprezá-las ou mesmo tenta domá-las, “civilizá-las”, seja lá o que
isso quer dizer. Não somos educados emocionalmente. Não nos ensinam
sobre a alegria, a tristeza, o medo, a surpresa, a raiva... Não nos convidam a
prestar atenção em como elas se manifestam em nossas vidas, em nossos corpos e
como é que fazemos para lidar com elas. Ao contrário. Por vezes somos até mesmo
ensinados a fingir que não existem. “Para de pular”, quando estamos alegres.
“Parece um menino babão”, quando as lágrimas expressam nossa tristeza!. “Vá já
para o seu quarto!”, quando, em um momento de raiva, quebramos um copo... A
verdade é que tão pouco sabemos a respeito das emoções.
“As
emoções”, de acordo com Brackett*, ao mencionar as ideias de Charles Darwin em
seu livro Permissão Para Sentir, “sinalizam informações valiosas e
energizam o comportamento adaptativo, fundamental para a sobrevivência”. E o
autor completa que “as emoções dão propósito, prioridade e foco ao nosso
pensamento. Elas nos dizem o que fazer com o conhecimento que nossos sentidos
transmitem. Ou seja, nos motivam a agir”. E aqui adentramos um campo especial: as
emoções nos fazem tomar ações diante da vida através daquilo que elas nos
dizem. Se vemos um amigo e nos sentimos alegres, nós nos aproximamos, não
há perigo. Se nos sentimos amargurados e entristecidos vamos atrás de
acolhimento e conforto. Se temos medo de algo ficamos atentos para enfrentar ou
fugir de um perigo potencial. Quando com raiva, especialmente, somos avisados
de que há uma injustiça acontecendo, estamos sendo invadidos em nosso espaço e,
então, brigamos pelo nosso território! Reconhecer as emoções e aprender a
lidar com elas pode ser um dos segredos para uma vida mais saudável. Sejam
quais forem. Tenham a fama que tiverem.
A
raiva, porém, carrega um peso especial. Isso porque não há espaço para a sua
expressão. Como exemplifiquei anteriormente, se permitimos sua
livre manifestação acabamos punidos, pois ela é compreendida como algo
desagradável, que não é aceito socialmente. E, tudo bem, não é que
vamos, em um momento de raiva, sair por aí depredando prédios, batendo nas
pessoas, xingando o mundo inteiro. A questão, no entanto, é que impedidos de
a expressarmos, acabamos inibindo o desconforto. Inibição, é importante dizer,
não é o mesmo que extinção. A raiva continua ali, presente, pulsando por
uma resolução, lutando contra a nossa resistência por lhe permitir ser
direcionada ao mundo. Nessa luta constante, ela se volta contra nós mesmos:
acontecem os processos autodestrutivos (foco do trabalho de Karina
Fukumitsu), incidindo os comportamentos autolesivos ou eclodindo as doenças
autoimunes. Na inabilidade por sentir e expressar nossas emoções,
acabamos em bombas com duas pernas. Neste sentido, ajudando-nos a entender
que o problema não é a emoção, mas sua impossibilidade de expressão, Oaklander**
explicita que “a raiva é um sentimento honesto e normal. Todo mundo sente
raiva. Eu sinto raiva. Você sente raiva. É o que fazemos com esse
sentimento, se podemos aceitá-lo, como o expressamos, que causa todo o
problema”.
Reconheça
e valide a sua raiva. Dialogue com ela. Aproxime-se dela e se conscientize
quanto à sua forma, intensidade e expressão. Como ela é
sentida em seu corpo? Quais pensamentos ela evoca? Em quais situações ela fica
mais evidente? O que ela o convida a fazer? O que é que dá vontade? Bater em
alguém? Calma. Isso pode lhe trazer problemas... Talvez possamos ir em
busca de outros meios para expressá-la agora que você já conseguiu se permitir
a senti-la, reconhecê-la e respeitá-la... Rasgue uma folha. Grite contra o
vento. Bata na almofada. Pinte com fúria. Escreva uma carta mal-educada para
aquele colega sem noção (apenas não envie rsrsrs). Mexa com argila. Suje-se com
barro. Corra. Caminhe. Exercite-se. Dê voz a essa raiva. Desenhe-a. O que ela
lhe diria? O que você diria a ela? Não fuja dessa emoção que veio aí. Nem
finja que não a sente. Pois, sabemos, você a sente. Não se fira. Nem se
machuque. Há modos mais eficazes de permitirmos que essa emoção escoa para
que, então, aliviados e clarificados quanto ao seu sentido, possamos agir de
forma mais tranquila e assertiva: movendo-nos em direção às nossas
necessidades. Pois, como Brackett esclarece aos seus leitores, “os
sentimentos são um tipo de informação. São como notícias vindas do interior de
nossa psique, enviando mensagens sobre o que está acontecendo dentro da pessoa
singular que cada um de nós é, diante de quaisquer eventos internos ou
externos. Precisamos acessar essas informações e, em seguida, descobrir o
que elas nos dizem. Assim podemos tomar decisões mais fundamentadas” (grifo
meu).
(*)
BRACKETT, Marc. Permissão para sentir. Rio de Janeiro: Sextante, 2021.
(**)
OAKLANDER, Violet. Descobrindo crianças: a abordagem gestáltica com
crianças e adolescentes. São Paulo: Summus, 2023.
(Texto
de Amilton Júnior - @c.d.vida)
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