Avançar para o conteúdo principal

[Psicologia] Psicoterapia e suporte

 


Conversas com amigos são importantes e insubstituíveis. Precisamos das nossas relações para que sejamos nutridos, acompanhados, tenhamos com quem compartilhar aquilo que, em muitos momentos, nos angustia e tensiona. No entanto, e isso é também é importante, as conversas com nossos amigos por vezes se deparam com limitações para aquilo que delas esperamos – ou necessitamos. Nem sempre a conversa com um amigo nos ajudará a compreender a forma de nossa depressão, ou o impacto da nossa ansiedade, nem mesmo nos confrontará com as escolhas equivocadas que temos feito acreditando que seríamos levados a determinados lugares. Isso porque aquele que nos ouve é nosso amigo. Talvez fique constrangido em puxar nossa orelha, ou por gostar de nós talvez não consiga ver o mal que temos feito a nós mesmos. Fato é que, apesar de extremamente valiosas, as conversas com nossos amigos – e demais pessoas queridas – nem sempre dão conta daquilo que precisamos.

 

É quando surge a necessidade – seguida da decisão – por uma escuta profissional. Não é que a escuta de nossos amigos seja de qualidade inferior, ela é apenas diferente e não possui – não sendo a sua obrigação possuir – o refinamento de uma escuta que, embora humana, tem em seu bojo uma variedade de ferramentas que a afinam e diferenciam. Uma escuta que, a partir de compreensões técnicas e teóricas, busca fazer com que também nos ouçamos. Ela não pode ser um mero eco, sem reflexão, de nossas falas ou de nossos discursos. Ou uma mera confirmação, sem problematizações, de nossas certezas inflexíveis. Ela precisa ser maleável para assumir a forma de questionamento quando perguntas forem necessárias, a forma de acolhimento quando uma compreensão empática for indispensável, ou mesmo uma forma de frustração habilidosa quando precisamos ser “descontruídos” em nossos modos habituais de agir – modos que, geralmente, nos adoecem e limitam.

 

Escuta que encontramos num trabalho de psicoterapia.

 

No entanto, essa não é a única característica que difere a conversa com um amigo de uma conversa com um profissional. Há tantas outras. E há uma que considero que seja essencial que possamos compreender, sobretudo num mundo tão acelerado e apressado. Muitos, ao considerarem a busca por um acompanhamento psicológico, chegam na ânsia por respostas que os auxiliem na resolução de seus problemas – e se frustram ao perceber que nem tudo pode funcionar no estilo “miojo”. Isso não é de todo um problema, afinal, ninguém precisa saber como as coisas de fato funcionam. Porém, precisamos entender que o ritmo da psicoterapia não pode obedecer ao ritmo desenfreado do mundo. A vida não é desordenada, se pararmos para pensar. Nós que a tornamos assim com nossas correrias inconscientes. Portanto, a psicoterapia também não pode ser apressada.

 

E não pode ser porque para que ela seja eficiente deve haver a construção de algo imprescindível: suporte! E acredito que esse seja mais um ponto saliente na diferenciação entre psicoterapia e conversações cotidianas. O indivíduo que busca pelo acompanhamento precisa ser respeitado em seu ritmo, em sua condição e em suas limitações. Ele precisa ser autorizado na constituição de seu próprio suporte para dar passos diferentes dos que foram dados até aqui. Ao invés de atacá-lo em suas projeções, por exemplo, ou resistências – como tantos psicólogos adoram mencionar –, devemos, antes, propiciar um espaço no qual ele se aproxime, pouco a pouco, de passinho em passinho, dos seus conteúdos, das suas projeções, ou introjeções, daquilo que aliena ou busca não ver – mas que, por isso mesmo, lhe traz sofrimento. Sua resistência precisa ser vista, reconhecida e compreendida em seu sentido de ser. Pois, às vezes, é um de nossos defeitos, como sabiamente pontuou Clarice Lispector, que sustenta toda a nossa estrutura. É necessário tempo para que algo melhor seja construído, formulado, para, então, ser posto em seu lugar – caso contrário, em meio ao vazio, tudo pode desmoronar.

 

Daí a importância de paciência quando diante de um processo psicoterapêutico. E daí a relevância de compreendermos o porquê de uma “conversa terapêutica” não poder ser igualada a uma conversa simples que temos com qualquer amigo em qualquer lugar. A psicoterapia, com o objetivo de nos oferecer suporte, é mais um encontro conosco mesmos do que um encontro com alguém para além de nós, por mais que estejamos diante de outra pessoa, oferecendo outra possibilidade de interação. E, a depender do caso, ela pode ser a conversa de que precisamos para que, então, possamos estabelecer conversas diferentes, pois muito do que vivemos de problemático em nossas relações é permeado pelas dificuldades internas que nem sempre contatamos. Contato necessário, eu concordo. Mas que não pode ser feito de qualquer jeito, com afobação. Contato que, por vezes, pode arder, para então aliviar – mas é necessário que haja suporte para que a ardência seja suportável.

 (Texto de Amilton Júnior - @c.d.vida)




~~~~~~~~

 

Salve o blog no seu navegador e acompanhe novas reflexões às terças, quartas e quintas, a partir das 06h da manhã!

 

Conheça alguns serviços:

 

Psicoterapia Online

Monitoria em Psicologia

Encomenda de Textos Personalizados

Grupos de Estudo e Rodas de Conversa

 

Você pode continuar acompanhando minhas reflexões:

 

- Perfil no Instagram (@c.d.vida)

- Página no Facebook (Coisas da Vida)

- Livros gratuitos (clique aqui)

- Ouça, ainda, o podcast Coisas da Vida no Spotify

- E não deixe de conferir o canal Coisas da Vida no YouTube!

 

É sempre um prazer receber a sua atenção!

Comentários

Mais vistas

[Reflexão] Antes que seja tarde

  Pense em alguém . Apenas pense em alguém, uma só pessoa. Talvez ela seja uma das mais importantes em sua vida – se não for a mais importante. Agora pense em tudo o que você sente a respeito dessa pessoa . O tamanho do seu afeto. A sinceridade de seu amor. O quanto ela representa em sua vida. O quanto as coisas perderiam o sentido se ela simplesmente deixasse de existir. O quanto você se sente verdadeiramente agradecido por ter tido a chance de encontrar a existência dessa pessoa em meio a bilhões de outras existências. Se o que você pensa a respeito dessa pessoa for mesmo sincero, real e verdadeiro, acredito que um sorriso possa ter sido esboçado em seu rosto . Porque você se sente mesmo especial por tê-la em sua vida. Seja um filho que tanto ama. Seja a esposa que tanto adora. Ou seja aquele amigo que tanto estima. Não tem importância sobre quem seja essa pessoa. O importante é que você reflita se ela sabe o quanto é especial e importante em sua vida . Será que você tem tido a ...

[Reflexão] O valor da presença

  A gente se acostuma. Infelizmente, na vida, a gente acaba se acostumando com aquilo – ou aqueles – que temos ao nosso lado, em nossa existência, compartilhando conosco algum trecho da longa estrada. Coisas importantes se tornam habituais. Seria bom se fizéssemos do hábito algo com propósito. O problema é que tornamos o rotineiro em automático . Não nos importamos em manter conosco aquilo – ou aqueles – que um dia fez o nosso coração vibrar intensamente. E então, vítimas do cotidiano, enganados pelo costumeiro, deixamos de valorizar como único, especial e singular aquilo – ou aqueles – que realmente é único, especial e singular. Valorizamos o banal, negligenciamos o essencial, e só nos damos conta quando nos perdemos de nossa essência: quando nos resta o vazio . “ Que não seja a falta a te ensinar o valor da presença” (Autor Desconhecido) Quantas perdas evitáveis você já sofreu em sua vida? E quando digo evitáveis são aquelas que, por uma falta de atenção, deixamos que a...

[Ebook] Palavras & Sentimentos

  Há algum tempo venho me dedicando a um projeto muito especial — um livro que nasceu do desejo de transformar sentimentos em palavras e palavras em companhia. Hoje, com o coração cheio de gratidão, compartilho com você o primeiro volume da minha nova coletânea de reflexões, Palavras & Sentimentos . Este livro reúne pensamentos, memórias, desabafos e descobertas que surgiram nos momentos mais simples e, ao mesmo tempo, mais profundos do cotidiano. São textos que falam sobre amor, saudade, autoconhecimento, perdas, recomeços, silêncios e tudo aquilo que nos atravessa quando decidimos viver com mais presença. Não é um livro para ser lido de uma vez só. É para ser sentido aos poucos, como quem conversa com um amigo num fim de tarde. Cada capítulo traz uma imagem, uma atmosfera, um convite à pausa. Talvez você se reconheça em algumas páginas. Talvez elas apenas abracem o seu momento. Mais do que respostas, quis deixar caminhos. E, mais do que histórias, quis abrir espaços para que ...